Uma forte tempestade que provocou chuvas torrenciais e inundações extremas no leste da Líbia devastou comunidades inteiras na costa mediterrânica, causando destruição generalizada e um número desconhecido de mortes, mas que já ultrapassa milhares de vítimas, disseram as autoridades.
A destruição atingiu a cidade de Derna, no leste do país, e outras partes da região na noite de domingo, 10 de setembro, quando a tempestade mediterrânica Daniel atingiu a costa.
Moradores disseram ter ouvido fortes explosões e percebido que barragens fora da cidade haviam rompido, provocando inundações repentinas em Wadi Derna, um rio que corre das montanhas, atravessa a cidade e desemboca no mar.
As autoridades declararam Derna uma zona de desastre depois que as enchentes inundaram bairros na manhã de segunda-feira, 11. Vídeos publicados nas redes sociais mostram grandes áreas de lama e destroços onde as águas turbulentas varreram os bairros residenciais.
Prédios de vários andares que antes ficavam afastados do rio tiveram fachadas arrancadas e pisos de concreto desabaram. Carros arrastados pela água ficaram jogados uns em cima dos outros.
Vítimas na casa dos milhares
As autoridades de Derna estimaram que o número atual de mortos esteja em 2,3 mil vítimas. Pelo menos 700 corpos recuperados foram enterrados até agora, segundo uma autoridade local.
As imagens mostraram dezenas de corpos com cobertores no pátio de um hospital.
“Acredita-se que muitos corpos estejam presos sob os escombros ou tenham sido arrastados para o mar Mediterrâneo”, disse Othman Abduljaleel, autoridade local da área da saúde.
O número de mortes, entretanto, ainda deverá ser muito maior, disse Tamer Ramadan, enviado da Líbia para a Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.
Ele disse em uma reunião da onu que pelo menos 10 mil pessoas ainda estavam desaparecidas. Usama Ali, porta-voz dos serviços de emergência do governo de Trípoli, a capital da Líbia, também informou que a tragédia deixou 7 mil feridos.
Cidades isoladas
Os residentes de Derna ficaram sozinhos logo após o desastre, com as autoridades do leste da Líbia afirmando que não conseguiram chegar à cidade de cerca de 90 mil habitantes.
Estradas bloqueadas, deslizamentos de terra e inundações impediram que os serviços de emergência chegassem à população das zonas afetadas, que teve de recorrer a meios rudimentares para recuperar os corpos e retirar os sobreviventes da lama.
Nesta terça-feira, 12, a maior parte do governo local chegou à cidade. Equipes do Crescente Vermelho de outras partes da Líbia também chegaram a Derna, mas escavadeiras extras e outros equipamentos ainda não haviam chegado lá, dificultados em parte por estradas cortadas e destruídas.
Redes de telefonia móvel e de internet também estavam fora de funcionamento, contribuindo para que as cidades fiquem ainda mais isoladas.
A ajuda também começou a chegar a Benghazi, 250 quilômetros a oeste de Derna. Oficiais militares egípcios chegaram a Benghazi junto com uma equipe de resgate e helicópteros.
O governo do oeste da Líbia, com sede em Trípoli, enviou um avião com 14 toneladas de suprimentos médicos e profissionais de saúde para Benghazi.
Comboios de ajuda foram enviados para Derna. O governo de Trípoli, dirigido por Abdelhamid Dbeibah, anunciou o enviou de dois aviões-ambulância e um helicóptero, com 87 médicos, uma equipe de socorristas e de investigação, além de técnicos para restabelecer a corrente elétrica.
País dividido
Conhecida pelas suas casas pintadas de branco e jardins de palmeiras, Derna foi construída em grande parte pela Itália quando a Líbia estava sob ocupação italiana na primeira metade do século 20.
A cidade já foi um centro para grupos extremistas no caos que se seguiu ao levante apoiado pela Otan que derrubou e matou o ditador de longa data, Muammar Kadafi, em 2011.
Derna é controlada pelas forças do comandante militar Khalifa Hifter, o homem forte do governo do leste da Líbia, baseado em Benghazi.
“As autoridades locais negligenciaram Derna durante anos, muitas vezes discutindo o seu desenvolvimento, mas nunca agindo”, disse Jalel Harchaoui, membro associado especializado na Líbia no Royal United Services Institute for Defense and Security Studies, com sede em Londres.
“Mesmo o aspecto da manutenção estava simplesmente ausente. Tudo continuava atrasado”, disse ele.
As infraestruturas da Líbia sofreram repetidos golpes ao longo da guerra civil que eclodiu após a queda de Kadafi em 2011. O país continua agora dividido entre governos rivais no leste e no oeste. O oeste, que abriga o governo apoiado pela ONU, apressou-se em ajudar o leste depois que as imagens apocalípticas surgiram.
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