quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Segundo dia do Simpósio sobre Direitos das Vítimas Criminais debateu o papel do MP em defesa das vítimas criminais e os fundamentos e limites dos mandados implícitos de criminalização

O segundo dia do 1º Simpósio do MPPE sobre os Direitos das Vítimas Criminais foi marcado por debates acerca do papel do Ministério Público na promoção da garantia dos direitos das vítimas criminais, e dos fundamentos e limites dos mandados implícitos de criminalização oriundos do Direito Constitucional e do Direito Internacional. O evento ocorreu na tarde desta terça-feira (24), e é promovido pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco (MPPE), por meio da Escola Superior do Ministério Público (ESMP) e do Centro Operacional de Apoio às Promotorias de Justiça Criminais (CAOP Criminal). A programação se estende até a sexta-feira (27), e ocorre por meio de videoconferência, toda dedicada aos membros e servidores do Ministério Público brasileiro e do Poder Judiciário.


O primeiro palestrante, Antônio Henrique Suxberger, começou às 15h, a exposição sobre “O Ministério Público e as vítimas criminais”. Ele é promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e também professor de programas de pós-graduação em Direito do Brasil e do exterior. A mediação do encontro foi feita pelo promotor de Justiça do MPPE, Mario Lima Costa Gomes.


Suxberger apresentou, inicialmente, alguns aspectos teóricos sobre o tema, criticando a formação do Direito Processual Penal brasileiro que, segundo ele, não explica a história do nosso Código Processual Penal, nem das nossas experiências. “Nós nos ocupamos a entender o modelo inquisitorial na França, na Espanha, na Itália, mas temos dificuldade de entender como esse processo se passa e evolui no Direito Processual Penal no Brasil. Eu destaco isso pois a Constituição de 1988 fez a escolha de um sistema penal normativo, que guarda inspiração numa modelagem inquisitória”, disse Antônio.


Dentre outros aspectos teóricos, Suxberger também tratou da invisibilidade da vítima, da abordagem criminológica e quais reações surgiram depois, e das gerações de estudos sobre vitimologia e vitimização. “Ao invés dos estudiosos se ocuparem de estudar meios de evitar a figura da vítima como janela de oportunidade para o crime, vemos muitas vezes no discurso jurídico frases de culpabilização da vítima pela prática do criminoso, o que em si é inadmissível. Em decorrência disso, as teorias feministas e a black criminology vieram, de alguma maneira, aclarar e denunciar essa prática de querer imputar à figura da vítima algum tipo de responsabilidade pela ação criminosa”, destacou o promotor.


O professor também destacou a importância da prevenção na criminologia. “Quando falamos de prevenção da criminologia, estamos falando de polìticas públicas de atenção ao fenômeno criminoso, e da abordagem em geral, que são as prevenções primárias, ou seja, a inclusão educacional, as ofertas de trabalhos técnicos, a capacitação profissional, o enfrentamento às desigualdades, os espaços de acolhimento e acompanhamento de vítimas e de vulneráveis. Tudo isso é política pública de prevenção ao crime”, explicou.


Para Suxberger, existem poucas ou quase nenhuma ação de acolhimento da vítima no momento da intervenção policial, e isso deve ser uma preocupação da atuação do MP. “Se não for o Ministério Público a fazer o papel de atrair as incidências do Estado para o acolhimento e atenção da vítima, ninguém o fará. O espaço de intermediação da função de estatal, em face da vítima criminal, é hoje exercida unicamente pelo MP, e é necessário que ele assuma isso como uma tarefa inafastável que decorra do seu protagonismo na persecução criminal”, ressaltou o professor.


Logo depois, às 16h30, o promotor de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), Carlos Gustavo Coelho de Andrade, ministrou a palestra “Mandados Implícitos de criminalização e a proteção às vítimas criminais”. Andrade também é professor licenciado da Universidade Cândido Mendes e autor do livro Mandados implícitos de criminalização: a tutela penal dos direitos humanos na Constituição e na Convenção Americana. Para mediar a conversa, esteve presente a promotora de Justiça do MPPE, Soraya Cristina dos Santos.


Andrade trouxe uma leitura constitucional e internacional do poder punitivo diante de graves violações de Direitos Humanos. “As vítimas de crimes graves têm seus direitos ignorados pela doutrina penalista majoritária no país, que se funda praticamente de forma exclusiva sobre o interesse do acusado e dos réus no processo penal. A partir de um curso que realizei na Alemanha, tive acesso a uma vasta bibliografia sobre Direito Penal Internacional sobre a doutrina penalista latino americana e europeia, e pude perceber que eles encaravam a questão de uma forma diferente, pois já tinham os influxos constitucionalistas dos Direitos Humanos incidindo de uma maneira mais nítida”, ressaltou ele.


Além disso, Andrade também destacou a vertente constitucional dos mandados implícitos de criminalização. “Fundada no princípio da vedação de proteção deficiente, e sob a ótica do Direito Internacional dos Direitos Humanos, com base nas obrigações em matéria penal reconhecidas pela jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Europeia de Direitos Humanos, estas construíram, especialmente da década de 80 em diante, uma jurisprudência que reconhece o dever estatal de promover a investigação e a persecução penal de crimes graves e de violações aos direitos humanos como forma de garantir um recurso efetivo às vítimas desses fatos, sejam eles praticados diretamente por agentes estatais, ou praticados por particulares”, disse Andrade.

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