terça-feira, 7 de agosto de 2018

Nova seção analisa o fenômeno e o impacto das fake news

Corria o ano de 1994. Na eleição para decidir o governador do estado do Maranhão, o candidato Cafeteira era o principal adversário de Roseana Sarney, pertencente ao poderoso clã que até os dias atuais se reveza na política local e nacional. Roseana liderava por apenas 1% de diferença nas intenções de voto quando, no início do segundo turno, os jornais e a TV da família, afiliada da Rede Globo, começaram a divulgar que Cafeteira havia mandado matar o adversário José Raimundo dos Reis Pacheco.

Faltando dois dias para o encerramento da campanha, a equipe de Cafeteira localizou José Raimundo e gravou entrevista com ele para exibir no último programa eleitoral gratuito. Naquela noite, a imagem da TV desapareceu misteriosamente em todo o interior maranhense. Só a capital São Luís, onde vivia 1/3 do eleitorado, testemunhou a imagem do homem dado como morto, atestando, ele mesmo, que o boato de assassinato era falso. O caso foi contado pelo jornalista Palmério Dória no livro Honoráveis bandidos, lançado em 2009.

Embora tenha caído nas graças populares, a expressão fake news – em referência a notícias ou informações falsas divulgadas no intuito principal de derrubar reputações, prejudicar adversários políticos e gerar lucro ­– não se refere a um fenômeno inaugurado com as redes sociais ou restrito ao terreno das comunicações digitais, conforme mostra o caso que abre este texto. Por isso, descolados de uma análise histórica e descontextualizados, os usos atuais do termo parecem não abarcar os limites de um fenômeno complexo ligado, por um lado, ao avanço da imprensa e da comunicação de massa e, por outro, à organização e consolidação (ou o contrário disso) dos regimes democráticos modernos.

Assim, as chamadas notícias falsas não devem ser definidas e analisadas fora do contexto político, econômico, social e tecnológico no qual estão imersas. Ao contrário, elas são elementos constituintes e constituídos pela conformação da concentração da posse dos meios de comunicação eletrônicos, impressos e digitais, pela ausência de regulação que promova a diversidade e democratização das informações e pelas dinâmicas sociais de produção e consumo de informação no âmbito das plataformas privadas de conteúdo na internet. Neste sentido, nos parece que a discussão deveria estar mais circunscrita ao guarda-chuva da produção de “desinformação”, termo, aliás, preferido por alguns especialistas mundo afora.

Nenhum comentário:

Postar um comentário